domingo, maio 29, 2005

QUE MELODIA!

Embalada nos teus braços, vou rodopiando sala fora, como nos contos das princesas e dos príncipes. A sala é enorme! A orquestra de violinos, em uníssono, toca a bela melodia, tema do filme “Love Story”.

Mil velas dão uma tonalidade pálida ao brilho dos espelhos. O mármore róseo do chão, brilhante como um diamante, ajuda-nos a deslizar, num ondear suave, envolvente, celestial…

Como se imagina o que se quer, quando se está a ser protagonista de um sonho de amor…

Por momentos a imaginação foi a mais bela realidade.

A nossa sala não passou de ser o anfiteatro de química do Liceu…

O som da música não foi senão o som do bico de Busen que fazia ferver um líquido aquoso, dentro de um balão, com um preparado qualquer, para a aula que seguia…

Íamos a caminho da sala de professores, quando me agarraste no braço e me segredaste, que aquela melodia não dava para resistir…

Como foi delicioso aquele intervalo! Nunca dançara uma melodia tão suave… Foi tudo num sem tempo maravilhoso… como ousamos!

Com os livros debaixo do braço, com a cara sarapintada do pó de giz, com um olhar de soslaio para a porta, com o ouvido afinado para o toque da campainha para a entrada, que deveria soar a qualquer momento… mas que maravilha…

Recordo bem o ar de espanto do nosso colega Aníbal, perguntando o que estávamos a fazer no anfiteatro. E como lhe explicaste que um aluno te tinha pedido para vires buscar os trabalhos de desenho, que me tinham sido entregues, para que os classificasses e depois os deixasse naquela sala onde teria aula mais tarde…

Como é bom ouvir a melodia que nos transporta ao sonho irrealizável dos factos impossíveis de reviver…



28.05.05

sábado, maio 28, 2005

FEIXES SILENCIOSOS

Que palavras existem mais fortes que o silêncio? Um silêncio tumular apenas cortado por um olhar profundo, são o suficiente para exporem o que no interior de ti grita… como entendo!

Jamais tentei aceitar, porque um querer forte começou a debater-se dentro de mim, desesperando os rios de sangue que percorrem os interiores desta caverna onde habito… e como custa aceitar que eles têm o que mais me julgava merecedora…

E eu vou gravitando neste universo sem estrelas rodopiando sob uma força incomensurável de atracção oposta… num pleno abandono, onde a palavra deixou de ser o elo de ligação para passar a ser o pólo negativo…

Que sentido faz sentido, quando o silêncio é a face oculta de um luar pardacento, onde outros astros que não estrelas, lutam pelo prazer de carnes amolecidas por deleites, distribuídos sem preceito… Que muito embora seja madrugada para serem divulgados, são sentidos em meu peito como um apedrejamento de malfeitores…

Se pelo menos houvera palavras, brotando com toda a sua força, desse interior rico de fantasias e múltiplas metamorfoses, na plenitude de todas as suas vertentes, então não esquecerias as minhas mensagens, não ocultarias os meus chamamentos, nem tão pouco dispersarias a tua atenção por mil outros recados aquando julgo que me vais abraçar… apenas sobes e sobes para que de um mais vasto horizonte me vejas com a insignificância que me atribuis…

Ao som desta melodia de uma história de amor, escrevo o que não digo a viva voz, o que o silêncio cala, porque todas as verdades são para ser caladas, porque as palavras sonorizadas ferem como zagaias envenenadas, quando são reveladoras de desprezo, de abandono, de incapacidade de traduzirem o que nos grita o silêncio dos neurónios em conflito…

Momentos há, em que estes corações se encontram. São momentos de plena existência, fazendo tudo todo o sentido, fazendo de nós os outros que não somos, mas que poderíamos ser, não fora o abandonarmo-nos num horizonte nublado, de palavras mudas…

E com a música continuando com um sentido, sem o sentido que já teve, deixo que os cristalinos sons se confundam com o som destes riachos de lágrimas límpidas, que choro enquanto escrevo palavras mudas, sem o significado que as palavras têm, se ditas e com um sorriso…

O desdizer do que dizes, sem perdão, é a minha mágoa constante. É o reavivar do que foi um sonho nunca realizado, é a minha derrota nesta guerra de sucessivas batalhas sangrentas e perdidas, em que resto como troféu do vencedor…

E não só as palavras me morreram na garganta como me gelaram as mãos e nem mais uma palavra consigo escrever… outra parcela de mim que se esvai como se fora a última gota de sangue que restava neste abandonado corpo, parco de vida e de sonhos…

28.05.05

ERA UMA VEZ

Era uma vez. Era uma vez, como em todas as histórias que me foram contadas aquando criança. Era uma vez, era a expressão de início de todas as histórias, mas como os tempos não mudaram em muitos aspectos, a minha história, também começa por “era uma vez”.

Assim,

Era uma vez um sentimento. Um sentimento bem parecido. Um sentimento bem-falante. Um sentimento envolvente. Um sentimento atraente.

Quando me bateram à porta e perguntei quem era, numa sem cerimónia indescritível, entrou e percorrendo o meu interior, instalou-se, sem pedir licença.

Pareceu-me um sentimento credível, porquanto respeitou o meu espaço e não fez perguntas desnecessárias. Apenas procedeu como um sentimento, tentando passar despercebido. Ambientou-se às minhas fragilidades e à minha repulsa por um sentimento que desejava não ter incluído em mim… Foi compreensivo. Foi carinhoso. Foi benevolente e teceu elogios ao que ia apreciando, sem contudo cair no exagero…pelo contrário, teve momentos que fazia questão de ser desapercebido da minha receptividade.

Ganhou terreno.

Lentamente foi estendendo os tentáculos dominadores, sem deixar que percebesse que era um sentimento…

E no meu “eu” foi crescendo mais e mais a cada momento, agigantando desmedidamente o seu domínio.

Um dia acordei cedo e completamente dominada pelo senhor sentimento. Absorveu todo o meu pensamento. Deixou todo o meu corpo num entorpecimento embriagador. Eu era uma pétala de rosa poisada docemente sobre as águas calmas de um lago de sonho.

Desde aí o senhor sentimento ocupou os meus pensamentos, minuto a minuto. Controlou os meus impulsos e controlou as minhas vontades também. Usou do seu “charme” para que as pulsões embora inatas, mas hibernantes desde havia muito, vibrassem ao primeiro sinal de alerta.

Gerou-se o primeiro conflito entre mim, o “eu” e o sentimento. Ambos queriam o que eu não sabia se queria. Ambos frenéticos, exageravam num querer quase que irracional enquanto eu, defendendo-me, repetia-me que não.

Mas a história do sentimento não fica por aqui.

Também ele estava hesitante e expectante. Também ele, sentimento, não sabia bem para onde queria ir. Continuava oscilante aonde iria ficar para todo o sempre. Se instalado em outros locais onde estivera antes, se dentro de mim… o sentimento não sabia exactamente o que mais desejava… outras experiências ou a repetição continuada de experiências anteriores…

Instalado que estava o senhor sentimento, partiu para a fase de destruição do que o rodeava, dominando sem se deixar dominar.

Inconscientemente, como sentimento, vagueava por todo o meu ser num à vontade principesco, nem se apercebendo que o facto de não me acreditar ou desentender todo o meu respeito por um tão nobre sentimento, me molestava. Passou a não responder aos meus chamamentos. Passou a ignorar as minhas mensagens e passou a mostrar quão mais importantes eram todos os outros por onde se passeava, ignorando-me, minimizando-me, chegando a votar-me ao ostracismo…abrindo a porta a um outro sentimento, que vagueava por perto, por já ter entrado por outras vezes no meu tão fragilizado “eu”: o ódio! E se esse “amigo” se instala também, então não voltarei a ter paz!

O senhor sentimento começou a jogar forte no fingimento de uma ansiedade programada, para destabilizar. Aguçou o seu narcisismo ignorando-me, enfeitiçando este ou aquele, tocando ou deixando-se tocar, menosprezando a ternura que lhe dispensava… inferiorizando toda a condição do meu eu… passou a manobrar-me como se manobra uma marioneta… mas, há sempre umas…até eu e o meu “eu” quererem… e então não mais entrará, se for expulso….

Ao deixar a história deste sentimento por aqui, não vou esquecer de deixar o seu nome, porque por acaso, pode bater à porta de alguém que esteja desprevenido e fazer a sua destruição, como fez em mim…
Chama-se Amor!



27.05.05

sábado, maio 21, 2005

HOMENAGEM PÓSTUMA!

Duas palavras!

Dois símbolos gravados para todo o sempre: Minha Amiga!

Um adeus que se esvai sem hesitação… Vão cortar o fio que me deixou todo este tempo na esperança de voltar a dar-te aquele abraço…

No dia que soube do acontecido escrevi-te assim:

… A tarde descai lentamente. Está frio porque sopra um ventinho atrevido. O Céu acinzentou. Tudo faz lembrar um fim de tarde tristonho. Como se tudo, de repente, chorasse a morte.

Passam pessoas: Elas, eles, criançada. Mas todos vão entristecidos como se lamentassem uma perda.

Não retenho mais as lágrimas que há horas já corriam interiormente. O vento fá-las ficarem frias e parece que tenho fios de gelo a escoarem pelas faces.

Nem por um minuto consigo deixar de pensar nos acontecimentos.

Vai escurecendo e cada vez mais frio eu vou sentindo. A tristeza que me invade é possivelmente a razão de todo este frio…

Como, como é possível? A minha amiga está desesperada…estamos!

Usada, desgastada e sem forças para qualquer luta, deixa-se num delírio de perdição… tanto que amou!...

Eu choro. Choro de raiva. Ódio, revolta, porque não admito que se use alguém desta maneira. Extorquir o quanto pôde chantageando a sua sensibilidade.

Num suspiro artificial vai ficar uma tão boa pessoa, até que o nem sei o quê a fará passar a um estado natural, de vida ou de morte.

Trocaria com ela! Sim, nada me retém sobre estes caminhos tortuosos e indefinidos. Trocaria com ela! Que serve este ter tão profundo sentimento, sentir tanta ternura e tanto amor? Espalhar tudo o que sinto por terras e vales, em cinza, como se fora pólen…

Trocaria com ela! Deixaria meu corpo definhar num fogo ateado, deixando que as cinzas incandescentes queimassem o que iria restar… Para que servem corpos vazios de ternura, sem o estremecimento desconhecido, apenas imaginado, seguido de um esvair de forças de prazer…

Trocaria com ela! Que já soube o que foi amar, que já gemeu de prazeres, que sonhou…embora com irrealidades…

Que ira! Que ódio! Que raiva! Como tudo está trocado!

E choro, choro porque sou impotente para o que quer que seja. Não tenho nada para dar, não tenho vida para trocar e já nem sei amar!...

… … …

E hoje, depois de saber que a máquina da vida vai ser desligada, choro torrentes de lágrimas nos meus interiores…não as posso derramar, porque ninguém entenderia… e nem um ombro amigo resta…parece que todos foram contigo…

Minha amiga Manuela! Não vou dizer que eras a melhor pessoa do mundo. Não vou proclamar que ensinavas como ninguém. Não vou repetir-te outra vez que desculpes o Abílio… afinal ele nunca prestou…Perdoa amiga!

Amiga! Tão jovem… não soubeste esperar que os anos te ensinassem o quanto custa perder um a um os amores da nossa vida… o gato, aquele copo de vidro amarelo… as cuecas de renda vermelha…o doce amante dos nossos sonhos…o colega que gostava de outros colegas…Amiga…com quem vou desfiar todo o meu rol de recordações?...

Amiga!...Amiga!... mesmo que grite já não me ouvirás mais…e mesmo que te queira contar o meu desespero pela razão da nossa última conversa…Não me ouvirás…nunca mais…

Adeus Amiga!!!


20.05.05

quarta-feira, maio 18, 2005

NOITE DENTRO…

The sound of the music is the refreshment of my spirit… and you dance like a butterfly around my dreams… beautiful dreams…

Love story… only Shakespeare could write a story like this…and the musician who composed this sound was completely inspired in the meaning of the story…

Here, thinking about those truths, in the beginning of the beginning and about everything you have told me… Here, visualising … could be the especial words to refill the whole story… but they only are words…the words you say to yourself… thinking …

E pela noite fora, continuando a escutar o melodioso tema de “Love Story”, vou deixando que frente aos meus olhos passe o filme revisto e o texto relido de uma das mais belas histórias de amor… e vejo-me com aquele lindo vestido de tule rosa pálido, com o grupo das colegas, quando dançámos em meias pontas, no palco do Colégio, para uma assistência de pais e familiares…e contigo no pensamento, inspirando o ritmo em que dançava…

How wonderful is to be in love… and to die for love… how I wonder to be that heroine … How happy I could be if I were that heroine…

Mas pela noite fora, os sonhos vão sendo o pesadelo do dia seguinte. E chego a detestar que o primeiros raios de sol me acordem… …

E a música continua a embalar meu pensamento, num misto de angústia e desespero, onde a saudade prevalece, por ser a saudade do desconhecido…é a saudade do imaginário… É a saudade do que não oiço. É a saudade do que não vejo. É a saudade dos lírios que navegam Tejo abaixo ou Tejo acima, conforme a maré… É a saudade da cor desses olhos, duns olhos cor de chocolate de leite, de uma voz enganadora, que chama e repele, que ama e odeia e desdenha dos sonhos dos pássaros que ao pôr-do-sol voam em curvas sinuosas por cima das copas das árvores…

Love Story! I hate! I love! I’m going on looking for my dreams…

19.05.05
01:38

segunda-feira, maio 16, 2005

E FOI!

Clarificaram-se as ideias. Dissiparam-se as dúvidas. Um reencontro pleno de emoções. Um reviver do momento a momento, em que não faltou a canção que recordei em transe.

Bebi todas as palavras, como quem bebe o mais fino champanhe, golo a golo, deixando-o escoar pela garganta, num misto de prazer e êxtase…

Cada gesto observado, foi observado como se estivesse a assistir a uma bela representação teatral.

Quando os teus dedos deslizaram pelos meus braços, senti que todo o corpo tremia. Mais parecia uma papoila num campo de trigo, baloiçando com a aragem da primavera…

Escutava. Sentia. Um deleite absoluto…

A tua voz era uma carícia constante, adormecendo-me os gestos e deixando-me prostrada, agonizante… Prazeres conjugados!

Momento a momento aproximaste o teu corpo do meu, que despido de roupagens e preconceitos, parecia um tufo de lírios de água, deslizando pelo Tejo abaixo…

A emoção foi crescendo à medida que as pulsões se intercambiavam e no momento exacto, pleno de entrega mútua, enquanto gemias a tua satisfação, eu gritava da plenitude do acto…

Enlaçados, recontinuados, reconquistados, estávamos finalmente juntos…

Tantos anos. Décadas! Finalmente juntos.

Morri a noite passada!...


In Miratejo
15.05.05
12H00

domingo, maio 15, 2005

PARAFILIAS!

O Senhor X entrou no meu gabinete de trabalho, quando o convidei a entrar. Hesitante e excessivamente “educado”, conforme foi a minha observação primeira.

Apresentei-me, ofereci-lhe lugar no cadeirão ao lado do meu e perguntei se realmente estava seguro que me queria como terapeuta. Esta minha observação foi feita na sequência do olhar “estranho” de “medição”, que o senhor X fez, quando lhe estendia a mão para me apresentar.

Sentado, perna traçada e com gestos que me pareceram estudados, começou a falar baixo e pausadamente, como que cada palavra fosse de peso exagerado.

Falou-me da namorada, de quem estava separado desde havia dois anos; dos amores que se seguiram, curtos, fugazes e inconsequentes.

Até aqui nada me parecia estranho, contudo, aquele olhar proveniente de uns olhos cor de avelã, era muito ambíguo. Fez-me tremer e recordar aquele amor passado…

De repente, como que uma labareda de malabarista lhe saísse da boca, perguntou se estava muito doente, porque ultimamente, exibia o seu sexo em frente de mulheres baixas e gordas, masturbando-se simultaneamente, como se fosse o acto de maior satisfação que poderia ter. No momento só tinha a ideia fixa de agir dessa forma. Contudo, quando era insultado ou agredido é que caía em si, tapava-se e seguia o seu caminho.

Expliquei ao senhor X que o seu caso não era único e que embora tenham sido objecto de muito pouco estudo sistemático, por serem casos de maior interesse no campo forense e de saúde pública, por interferirem mais nessas áreas. Contudo, existem referências de tratamentos cognitivo-comportamentais, hormonais, psicodinâmicos e farmacológicos.

O senhor X olhou-me incrédulo uma vez mais e com uma espontaneidade que me surpreendeu, disse que já sabia que não mais ia ficar bom e que a qualquer momento não ia resistir às clientes da tabacaria do seu bairro…

Marquei nova sessão para daí a três dias. O senhor X pareceu-me estar consciente do problema que o afectava.

Somente com algumas sessões poderia definir a gravidade do estado deste cliente, pois que as formas mais graves de Parafilia podem ser persistentes e resistentes ao tratamento.

Continuei a assistir este paciente por seis meses.
14.05.05

sábado, maio 14, 2005

AUGÚRIOS DE DESESPERO

A vereda apertada dava para uma ravina abrupta entre a terra e o mar. Os penhascos eram medonhos. O mar lá muito em baixo, era batido e a espuma branca parecia roupa branca em desalinho. Mergulhei os olhos naquela imensidão e perdi o pensamento em pensamentos loucos… e se mergulhasse?...

Faltaria ao encontro e perderia a única possibilidade que me restava de escutar o que tinhas para me dizer. Muito embora não estivesse profundamente interessada em sabê-lo, contudo a curiosidade angustiava-me.

Eu sentia, eu sabia, porque uma música interior soava baixinho, como marcha fúnebre. O convite para ir à casa da colina, era apenas, para uma vez mais, me amarfanhares a sensibilidade e desrespeitares o meu puro sentimento de amor.

Os líquenes das rochas pareciam belos arabescos de uma pintura abstracta de algum pintor célebre. O piar das gaivotas, por momentos, pareceu-me de mau agoiro e hesitei, se havia ou não de seguir o meu caminho. Procurara o caminho pela vereda, para não seguir pela estrada, nem tão pouco ter a tentação de ir de automóvel. Poder-me-ia cruzar com quem não desejava ver, fosse em que circunstância fosse e o facto de me chamares à casa da colina, poderia ser por já te encontrares lá, por terem estado juntos.

Memorizei uma vez mais o que queria dizer. Revi mentalmente o papel que ia interpretar. Não podia falhar nem numa vírgula. Clarificar posições; esclarecer dúvidas e demarcar a minha distância. Eu não aprovava de forma nenhuma a ambiguidade daquela relação. Não por ser o que era, mas por ser com quem era… Jogando sujo, despersonalizando, manobrando, enfim, um todo de negatividades que prejudicavam mais do que beneficiavam.

Não me restavam dúvidas que era o amor da tua vida. Nem por hipótese, alguma vez tentei sobrepor-me, mas nunca consegui aceitar. O duplo papel que me permiti interpretar, só teve como finalidade mostrar o lado negativo e avassalador que tinha sobre ti. Mas tu sempre tiveste consciência disso e por tal assumes essa responsabilidade.

À medida que ia subindo a caminho da casa da colina, mais tensa me sentia. Ia certamente ouvir o que mais desejava não ouvir. Iria deitar morro abaixo, um ror de sonhos e de ilusões que construíra, estupidamente, confiando nos meus valores e nos dotes que sempre supusera ter…

A casa estava com pouca iluminação. Bati e entrei, pois apenas o trinco me separou do lado de fora para o lado de dentro. Beijei-te e senti-te transpirado e com aquele detestável cheiro a after shave, que já conhecia de outras vezes que nos encontráramos no momento seguinte…

Como era possível? Como é que eu havia aceite? Mas estava pronta para ouvir o veredicto.

Não me encaraste nos olhos como das outras vezes. Estavas esbodegado e abatido e teu olhar distante era mais do que revelador de tudo o que anteriormente havia recebido quase com naturalidade. Mas hoje não. Nem mais uma vez. Não conseguia admitir que estava em segundo plano.

O golpe não foi tão agreste quanto eu vinha imaginando, caminho fora, talvez por vir preparada. Mas foi mesmo um profundo choque, quando friamente revelaste que a escolha estava feita. A tua expressão abnegada de escravo, comoveu-me e mais por ti do que por mim, tive uma vontade imensa de chorar.

É verdade. A escolha estava feita. Alguém havia saído vitorioso. Quem seriam as próximas vítimas a servirem de fetiche, para as vossas orgias? Quem mais iria sofrer, aceitando o papel que interpretei durante tantos anos…?

Não fora necessário relembrar o que levara o caminho todo a arquitectar. Nem houve muito tempo para me fazer ouvir. Saí quase de imediato. Cabisbaixa e tão triste, que nem me apercebi que toda a vereda foi caminhada por tacto, pois era noite cerrada…

Passados que são, os tempos que já lá vão, continuo sonhando que um dia me chamará para voltar à casa da colina, mas sem que tenha lá estado alguém, antes de mim…


13.05.05

sexta-feira, maio 13, 2005

SUSPIROS EM VOLÚPIA

No meu interior senti o teu chamamento.

Meti-me no carro e aquelas dezenas de quilómetros que nos separam, foram um nada no imenso mundo que temos entre nós: anos luz… tempo… sem tempo e então agora que a ciência anda a descobrir dados novos sobre as teorias de Einstein…

E os nossos suspiros entrelaçaram-se num ror de carícias e ternura. Entre gemidos e ais desbravamos todo um caminho de desconhecimentos… meus desconhecimentos!

Vieram-me à memória os nomes todos que beijaste, os momentos de afago que te fizeram. A tua paixão por aquele nome que balbucias, às vezes, causando-me ciúme e angustia…Porquê? Que fora, ou que tem significado para ti?

Mas o teu suspiro acalmou minhas ânsias e desdobrando-se numa ternura até então desconhecida, fui vibrando como as cordas de um violino… e entrelaçados, como se apenas um fossemos, gemendo como a mais bela melodia celestial, em uníssono trememos e trememos numa volúpia indescritível… e de novo, num recomeço sem início voltaram os nossos suspiros a um baile infernal de ternuras e beijos sem conta…

O tempo passou sem que me apercebesse. Um apito estridente soou no ar e uma voz forte disse por um altifalante que eram horas de encerrar… Olhei em volta e não havia ninguém. Tudo estava alinhado e florido como quando entrara. O céu tomara uma cor entre o rosa escuro e o arroxeado. Levantei-me. Olhei de novo para o mármore muito polido, onde apenas sobressaia o teu nome em letra gótica esculpida e pintada a dourado…esbatido…pelo ror de anos que já lá vão…

Em passos lentos saí, depois de caminhar por todos os arruamentos que me levaram até ao grande portão em ferro trabalhado e pintado de verde escuro…

Vinha tão leve, tão segura, tão eloquente, que nem sei se conduzi ou fui conduzida… e cheguei e aqui fiquei de olhos parados, sem deixar de pensar um momento que fosse, em tudo o vivera…

Por momentos não houve mais ciúme. Conseguira vencer todos os nomes! Era eu! Eu e só eu.

13.05.05

Não em Maio!

As conversas ao telemóvel cruzam-se com as conversas vivas, entre os passageiros do comboio.

Risos, inconveniências, irreverências, são um todo que se mistura e confunde nos meus sentidos. O eu e eu, aqui sentados estamos! Vendo o caminho em recuo, uma vez que gosto de me sentar nos bancos de recuo…

E se levanto os olhos e revejo a paisagem passante, vejo-te entre os prédios, entre as árvores, reflectido no Tejo. Como gosto dos teus olhos!

Mas domina-me a insegurança do serei capaz?...

Ter medo é a característica básica, que me impede de tomar uma decisão definitiva: Dizer não!. O não ambíguo dito nestes últimos anos não foi suficientemente convincente para mostrar que não é não!

Essa insistência é como um pesadelo. Já não é só no sono, mas a cada instante… Essa persistência tornou-se doentia e assaz mortificante…

Não quis o brilhante, porque não troco nada.

Agora não quero o Audi. Não quero a viagem. Não quero absolutamente nada. Nada!

Amor não se compra. Carinho, ternura, amizade, não têm preço… Nada disso se compra!...

Não quero que os meus “eus” se sintam obrigados ao que quer que seja. Quero ser eu e apenas eu!

Quando a noite chegar e o céu ficar muito escuro, quero apenas ver os outros olhos, os olhos do além, que continuam, como as estrelas, a cintilar no meu horizonte…

E a verdade surpreendeu-me!... Como é atrevida a insistência… Nunca quis acreditar que sobrevoarias o covil onde me escondo…Mas podes acompanhar os pássaros da noite, podes tocar clarins, podes pôr todos os sinos a tanger, que sempre direi não…


12.05.05

Tecelagem de ideias

Uma rede imaginária é tecida mentalmente enquanto os meus “eus”, em luta renhida, disputam o que cada um quer. O pior é que ambos querem o mesmo: o teu amor!

Que ridículo! É profano! É sobretudo crime!

Ciúme! Sim, ciúme é o que há de mais devastador e é o ciúme que os meus “eu” sentem entre si. Ambos querem a tua atenção. Ambos querem ser o mais importante!

É devastadora a falta de auto-confiança que impera entre um, em relação ao outro. No fio que corre geram-se nós que não deixam o fio correr livremente e a tecelagem encrava e o tecido sai imperfeito… Corta-se o fio e tudo volta à estaca zero!

A pergunta esvai-se no sussurro do vento que começou a soprar: de qual dos “eu” consegues gostar um pouco? Qual vai ser o vitorioso? Detestas ambos, já sei!!!

Os medos voltaram. A incerteza cresceu e o desejo de partir tornou-se incomensurável…

12.05.05

quinta-feira, maio 12, 2005

IN

11.05.005 – 12H30!


Silêncio! Foi o grito mudo que escutei ao meu chamamento repetitivo!

Silêncio! Foi o desprezo traduzido em silêncio…

Silêncio! Apenas silêncio para tornar mais acutilante o desprezo sentido…

Silêncio! Desprezo! Silêncio!

Silêncio! Resposta relevante a uma pergunta incisiva: silêncio! …

Sem palavras, sem sons, sem respostas, o silêncio imperou. E com o silêncio é cúmplice do desentendimento. Eis que me sinto desentendida, expectante, desiludida!

Julgava ser digna de receber as novidades em primeira mão… julgava, mas estava redondamente enganada.

Não querer ferir susceptibilidades… não… não… Não entendi. Apenas teria querido saber em primeira mão, mas para me congratular… as coisas não são como às vezes parecem… e eu apenas queria ser quem sou e não sou sendo.. e apenas não serei senão a resposta silenciosa a todas as perguntas que fiz, só obtendo silêncio…

quarta-feira, maio 11, 2005

Diário - Adeus dia 9 de Maio

Amanheceu! Um dia igual a tantos outros, sem que se deixasse perceber que alguma coisa de diferente existia na realidade.

É verdade! Existe sempre uma qualquer coisa para que o dia de ontem não seja igual ao de hoje e mesmo no mesmo dia, as horas que o preenchem se assemelhem…

O meu pai faria oitenta e quatro anos, se não tivesse partido há cinco…

Tentei esquecer o dia todo, os muitos aniversários que partilhei com ele. Tentei não abordar o assunto a absolutamente ninguém, nem mesmo com quem, convivendo longe mas perto, partilho todos os minutos de pensamentos da minha vida. Lembrei amigos já no longe e os que estão na indecisão da partida… e mais sofrida me senti, quanto o meu suspiro pressentiu a distancia que querias fazer prevalecer… Ninguém me entende!

Tantos desconfortáveis diálogos com o meu pai!

Tantos azedumes por contrariar os meus quereres!

Tanto desgosto por não entender os meus amores…

Pois é! É mesmo isso… mas crê, só anos depois os entendemos… embora se nos tivessem entendido antes, talvez não sofrêssemos no depois…

Depois vem o escrito, infinitamente suspenso na indecisão do que não é dito e a ambígua “enxotadela” como se fora uma mosca melosa, a incomodar…

Depois vêm os cínicos vocábulos, enganadores, mas enciumados, trapaceiros, plenos de desfasamentos, ante a tão triste tristeza que me parte a alma…

…E o digo o que não disse e que direi sem dizer…para quê? Quem espera o quê, de quem? Se não tenho direito a nada…apenas a que sequem todas as plantas que ainda estão verdes… que sopre vento no dia que espalharem as minhas cinzas no túmulo da minha saudade… espero ter direito a esse desejo…

É isso pai! Vivemos tão pouco tempo juntos… fui embora… e agora seria bom dizer-te que tenho o coração cheio de um terno sonho como o que não permitiste que tivesse aquando deveria ter tido…

É isso! Nem uma flor te deixei na campa no dia nove deste ano! Mas amo-te muito, pai.

É isso! Agora sabes porquê estive tão triste e estou… Agora percebes porque me magoa tanto o não me falares quando necessitava…pois é! Como todos se parecem…

10.05.05

domingo, maio 08, 2005

TENHO DE

Tenho de escrever! Tenho de dizer em palavras escritas o que me vai pela “imaterialidade de mim”… tenho de deixar que fios de tinta desenhem o que em pensamento são catadupas de ideias, sonhos, desilusões, ódios, esperanças e medos… tantos medos!

Tenho de arrumar as ideias. Tenho de não sentir esta dor que me deixa dormente. Tenho de dizer não ao que queria gritar que sim… tenho de pôr de parte o que tanto desejo…

Tenho de limpar os recantos obscuros do pensamento. Tenho de esquecer o que está presente em cada momento, em cada esquina, em cada janela, em cada chama que se enlaça nos madeiros de uma lareira… nas águas que correm Tejo abaixo, sempre sussurrando o teu nome…

Tenho de esquecer a ternura das tuas mãos, enlaçadas nas minhas, rua abaixo… ao sol de Maio… Tenho de esquecer as caminhadas ao longo da areia macia, mãos nas mãos… tenho! Tenho!

Tenho de não lembrar de novo os olhos teus. Tenho de esquecer o sortilégio que me causam. Tenho de dormir profundamente, para que os sonhos não me abanem o corpo e deixem que o meu suspiro se espalhe como o piar de uma coruja, noite adentro…

Tenho! Tenho! Tenho. Sempre tenho de ter algo que tendo, não tenho na realidade… Tenho sobretudo de dizer não a mim própria e deixar que se esvaiam todos os tenho de, que me oprimem e deixam que o desespero me domine, num deserto sem oásis…

Tenho de aceitar! Acreditar. Tenho de abdicar! Tenho de, de olhos abertos, apenas ver a escuridão que me abraça, que me aperta, que me sufoca…

Mas… não tenho de viver ante o todo que me mata no cada dia que se espraia neste oceano da inexistência…



08.05.05

sábado, maio 07, 2005

Incógnitas

Como posso acreditar na vida, se ela não tem sentido para mim…
Como posso aceitar o que no dia a dia tenho de digerir, contra ventos e marés, quando é de uma adversidade total?...
Como posso rejeitar sistematicamente o que meu sangue grita impetuosamente…
Como posso ser o que sou sem ser, em cada momento, dando o que não é nada e tendo um tudo para dar…
Como posso estar sem estar, querer sem querer e aceitar ter o que não tenho e tanto desejava…
Como posso deixar-me continuar a existir sem existir, pois que não é só a mente que existe…e o corpo?
Como posso abafar os gritos sucessivos que dos meus interiores soam, calando-os com a mentira da existência?
Como poderei continuar, nauseada, pelas carnes moles e desinteressantes, muito embora com um intelecto formidável?
Como continuarei a deixar que meu corpo seja violado pelo sem sentir do nada sentindo, por dever, por troca, por permissividades…
Como não será o que será no amanhã, que se passar a existir, poderá não me ter como componente…
Como, como…
… … … … …
sem resposta!



06.05.05

E a vida é feita de sorrisos…divagos!

…. E a vida é feita de sorrisos, de esperas, de lágrimas de dor e um pouco de esperança…

Os sorrisos afloram aos lábios por um acto de gentileza, por um qualquer momento de boa disposição…por uma boa recordação…

Esperar! Esperar… esperamos tantos tempos pelo nosso tempo fora, que por vezes esquecemos de somar todas as esperas… concluiríamos, seguramente, que uma grande parte das nossas vidas é preenchida por esses tais tempos de espera…mais do que os que viveremos com vida!

Lágrimas de dor são todas as que nos correm pelo rosto, sem que as consigamos reter…são as que deslizam dentro do peito como rios vertiginosos, entre altas ravinas, são, sobretudo as que sem exteriorização, provocam uma dor tão penetrante como se nos estivessem a trespassar espadas em brasa…

Esperança… que será esperança? Talvez o que nos faz viver para termos um bocadinho do que havíamos esperado desde sempre… e subtrairmos aos tempos de espera…

Ilusão! São outros tristes sorrisos que nos afloram aos lábios em momentos como estes… e como é este momento? É o momento em que sinto a multiplicidade de actuações à minha volta, de actores não actores, protagonistas de teatros do imaginário, que apenas se movem com a pulsão emanada do outro que o chama e que desdizendo a mentira, são uma verdade difusa entre braços e pernas, lábios e rostos, sexos iguais em gozo desvairante, como que mostrando à Natureza como os fez…

Sorrisos! Sorrisos de revolta por gravitar num desejo incomensurável de prazeres proibidos, de ideais adormecidos no fundo de um sepulcro…

Sorrisos também, para não chorar, por ter sem ter o que desejaria, por ter de dar, por ser pedido e não dar, vender, para receber o que nem sempre preciso… porque o que preciso não tenho, nem jamais encontrarei onde possa ter… contradições do viver!

Sorrisos de ódio. Sorrisos de fúria. Sorrisos de escárnio. Sorrisos de nojo de carnes flácidas e bocas sorridentes e fantasiosas, com promessas fastidiosas e frases estudadas para impressionar…

Sorrisos dos que falando verdade mentem, porque a felicidade é uma utopia e a utopia é uma mentira!

Por tudo isto estou sempre sorrindo!!!

06.05.05

Como isso se sente tão bem!

Comentário

Como isso se sente tão bem!...
Como se destrói num minuto o que não se consegue construir numa vida!

Quando se recusa um braçado de rosas viçosas por uma seca e com espinhos...é ser-se mesmo destituído de bom senso...por isso as fumaças subirão em espiral, procurando a liberdade que lhes é devida.

Se com ela for um adeus a mais uma saudade, que vá...será mais um luto a ser trabalhado sob a tristeza que todos os lutos causam...e este irá ser difícil de passar... mas se assim é, será!


Sem uma lágrima, sem um adeus,
sem um olhar triste de melancolia
sem olhar de novo os olhos teus...
sem ouvir o sonho da tua melodia...



Comentário a CLAMOR DA VONTADE
27.04.05

sexta-feira, maio 06, 2005

ABRIL!...

Abril é Primavera. É doce botão de rosa que abre lentamente com o calor do sol que dia a dia é mais brilhante e quente.

Abril em Portugal!...
Primavera no país encantado, onde o sol brilha livremente, sem sombras de grandes arranha-céus. Onde nas vielas estreitinhas, da velha Lisboa, se ouvem de quando em quando, nas manhãs primaveris o apregoar de um peixe fresquinho, duma hortaliça viçosa. Restos dos tradicionais pregões da cidade. Como é bonita Lisboa na Primavera! Como ela é sempre bonita!

No Bairro Alto, uma varina corre com a canastra à cabeça. Atrás dela, aqui e além, aparece uma nesga do sol que a persegue logo ao nascer. Um gato preto corre, salta e de telhado em telhado, procura algo para comer.

Em cada janela um vaso de flores; uma roupa branquinha que seca; uma velhota de preto que chama o padeiro…

Há alegria. O sol de primavera enche os corações de esperança.

Ao entardecer, bandos de andorinhas chilreando, voam desenhando curvas sinuosas e vão para os seus ninhos nos beirais dos telhados velhinhos. São tão encantadoras as andorinhas! Trazem alegria, anunciam a Primavera.

Lá em baixo, o Tejo sempre belo, no seu balançar constante, admira a cidade.

Na Lisboa moderna, as cores suaves dos grandes imóveis atraem. Também há janelas floridas, cortinas garridas e gatinhos nas varandas.

Nas ruas, bastante largas, o movimento aumenta. As esplanadas, à noite, começam a encher-se. Nos jardins, crianças brincam alegremente. É Primavera!

Paira no ar o suave perfume das flores.

No Chiado, violeteiras, com cestinhos na mão, perguntam a quem passa, se desejam um raminho, na atmosfera vai ficando o doce perfume das violetas…

Quando o sol declina, à hora do crepúsculo, o movimento aumenta. No cais os trabalhadores aglomeram-se. Todos procuram chegar a casa mais cedo. A suave brisa do Tejo acaricia as faces de quem passa. O cheiro a maresia abre o apetite. Correm costureirinhas, serralheiros, “magalas”: vão apanhar o cacilheiro.

A cidade acende suas luzes. É belo! Parecem estrelas cintilando em cada janela…

E quando a lua sobe, há quem pense a meia voz: “Estamos em Abril. É Primavera!”


“escrito em 1961”

domingo, maio 01, 2005

Carta

Possivelmente, todas as letras que deixar nesta folha não serão mais do que letras para quem as ler. Serão as letras ditadas por um coração triste que irá ser dito de “lamechas”, de uma mulher com muitos anos e que ao cabo deles, sente o quanto desperdiçou todos os momentos que lhe passaram, sem ter satisfeito os seus mais ardentes desejos: O de ser mulher!

Ser-se mãe não significa de todo ser mulher. Mas ser mãe significa com certeza, ser um todo de amor, de carinho e de esperança que o seu rebento saiba compreender um dia o que é ser mulher.

Seria o acto mais maravilhoso, o de os filhos não esquecerem as mães no dia em que os Homens decidiram que seria o seu dia, muito embora o dia da mãe, sejam os trezentos e tal dias de cada ano, de todos os anos em que ela estiver viva.

Quantas mães esquecem o ser mulher, para que seus filhos desfrutem de todo o amor, que por acumulação, lhes é transferido incondicionalmente, deixando o seu papel de mulher, tão à margem que fica banalizado, no dia a dia que passa correndo.

Como podem ser julgadas de infiéis, desabridas e outras qualificações, quando sem o amor aos filhos, desprestigiadas pelos companheiros, buscam refúgio no primeiro monte de sucata que encontram na estrada? …

Como podem os filhos culpabilizar suas mães de admitirem o seu “uso” como mulher, quando o fazem para os proteger? Mesmo que essa protecção não passe de uma forma que lhe impuseram na sociedade em que se integra?

Se os “ses” da vida fossem de possível tradução, se os “ses” do cada dia que passa se pudessem transformar em belas rosas, viver-se-ia no mais belo roseiral sobre a Terra…

Para os Homens, que filhos são, vejam naquela mulher uma mãe e dêem-lhe o carinho que merece. Vejam-na como mulher e amem-na com toda a doçura que ela tanto poderá estar a desejar… respeitem e louvem o amor que lhes dedica, porque é tão puro como a lágrima que me corre lentamente pela face, depois de já tantas ter chorado…

Bem hajam os que não esquecerão o dia um de Maio!