Sentei-me em frente daquele tanquezito, no jardim ao fundo da Avenida.
Meditava.
De repente, meio surpreendida, dei comigo num discurso a meia voz, tentando fazer crer (não creio) senão a mim própria, quanto é desnecessária a palavra, quando dita sem ouvintes. Não. Quando os ouvintes estão lá, mas não ouvem. Então, vem-nos uma vontade desmedida de fazermos silêncio. Mas como o silêncio deixa ouvir o éco do nosso pensamento, continuei.
Lembrei-me então que, para transmitir, terei de continuar a falar. A minha palavra é a voz do chamamento. Tenho uma palavra a dizer: a Ti, a Todos!
Mas o ondear da água naquele tanquezito, onde boiava uma folha seca, fez-me alertar os sentidos e, pensamento em ti, eis-me retomada ao discurso. Eis-me a pegar de novo na palavra, que ligada a outra palavra, forma a frase que pode ser uma afirmação e/ou uma pergunta: É verdade! Uma pergunta: porquê a mentira?!
Aqui parei e olhei. Meditei noutros aspectos, para retomar a corrente do meu pensamento, que ainda activado por uma frase de Samuel Beckett “Toda a palavra é como uma desnecessária nódoa no silêncio e no nada”, me fez afluir à memória aquele dissertar sobre a mentira – a tua mentira – que sob a desculpa de não magoar, quase assassinava o meu espírito...
... Surgiu todo um ruir de sentimentos e de ilusões, deixou de ser verdade a verdade e o espectro fúnebre do mêdo da mentira passou a ser a veste comum que jamais despi...
Uma rajadazinha mais forte sobressaiu na aragem que acariciava os meus lábios e a água do tanquezito, à minha frente estremeceu. Vi-me retratada às ondas e veio-me à memória a acareação. Eis-me entre eles: a Verdade e a Mentira. Uma vez mais e tu e ela e ela e tu, onde a palavra foi realmente a desnecessária mácula que perdurou e que deixou nada. Deixou-te para mim...
-“Jura dizer toda a verdade e só a verdade?...” – Jamais havia pensado na profundidade de tal frase... Agora, que recordo a “recordação” daquele momento, em que no jardim ao fundo da avenida, frente a um lagozito, meditava, quase a meia voz, é que sinto quanto me é grata a frase “... jura dizer toda a verdade...”. Gosto da verdade. Sou pela verdade.
Se não fora já tão crescidinha, creio mesmo, que iria prometer, que ao meu redor só se diria toda a verdade, fosse em que circunstâncias fosse e fossem quais fossem as consequências.
Mas neste meu discurso directo, em que, sem outro fim que não seja o de chamar a atenção dos que pela mentira se separam, se afastam e se odeiam, não deixo também de recordar o Sermão de Santo António aos Peixes. Eis-me quase como o Santo, que em frente ao lago falou, sem ouvintes (apenas os peixes), em prol do Bem e da Verdade.
Se calarmos este dom, que é a fala, aí, deixamos perder qualquer oportunidade de transmitir, de estudar, de enfim, marcarmos o caminho que trilhamos, com o que de bom temos.
2005
terça-feira, fevereiro 01, 2005
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