segunda-feira, outubro 10, 2005

O ESCRITOR FAMOSO E OS ELOS DO PASSADO

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Levantei-me e dei passos à toa pelas veredas do jardim da minha infância. Voltei a olhar o baloiço e lentamente atravessei o jardim de todas as minhas recordações. Os meus passos ressoavam no saibro solto e por entre a folhagem da velha árvore, parecia-me ver os olhos de Helena a admirarem-me.


Em passos lentos dirigi-me à minha casa. Cruzei os arcos de pedra cansada pelos anos que seguravam as ogivas.

Entrei na sala e olhei os cadeirões forrados de tecido florido, onde minha mãe se sentava comigo, para conversas e às vezes reprimendas… Sentado naquele cadeirão à esquerda, perguntou-me minha mãe, com ar severo, o que havia estado a fazer com Helena, naquele dia em que nem percebi o quanto Helena significava…

Abri a janela. Olhei para fora e vi-me criança, de calções ainda, correndo para apanhar borboletas…

Atravessei o corredor e no meu quarto, apenas abri a janela, de onde vi a paisagem, que em nada mudou… Dei meia volta e fui sentar-me perto da varanda, com as vidraças abertas, respirando o ar fresco do arvoredo. Mas a imagem de uma Helena tão criança ainda, não deixava de saltitar na minha imaginação. Agora compreendo como sempre a amei… Helena! Helena!...

Os olhos meigos e serenos de Helena, foram ao longo da minha vida, a doce companhia da minha filantropia.


Abri a última gaveta da estante de meu pai, onde minha mãe foi guardando os meus papéis, como costumava dizer, os velhos cadernos escolares e entre muitos desses papéis lá estavam uns quadradinhos de papel com desenhos de flores e o nome de Helena no meio…

Depois da morte de meus pais, era a primeira vez que aqui estava, serenamente, para actualizar burocracias e para recordar a meninice que tantas saudades me deixava…

Olhei de novo ao meu redor e tentei reviver todos os momentos, para me localizar nesse passado distante e idealizar como estaria Helena, que deixara de dar notícias desde tempos indeterminados…

Passei horas e horas neste vai e vem, de divisão em divisão, e já à noitinha, o senhor Chico veio trazer-me uma sopa ainda a fumegar e um naco do bom chouriço de seu fabrico e umas fatias de pão, para aconchegar o estômago.

Tagarela o bom velho Chico, que me conhecera miúdo, com poucos anos de diferença dele, pois que quando nasci a mãe dele trabalhava cá em casa e ele era muito criança…chegámos a chutar a bola nas traseiras, quando regressava da escola. Mas a tagarelice do bom Chico deu para me preencher as lacunas de memória e para me dar algumas novidades que desconhecia.

Também tinha na mão um pacote de correspondência que havia junto, para me entregar, quando me voltasse a ver.

Cartas! Uma infinidade delas, para meus pais. Publicidades e postais de amigos que haviam partido para o estrangeiro durante a minha ausência e de quem não ouvira mais nada… Mas! Surpresa, aquela carta pareceu-me estranha…de uma Helena Portier…para mim…

Abri sofregamente, sem dar ouvidos ao Chico, que a sopa arrefecia, e comecei a ler. Helena! Minha doce Helena! A carta havia sido escrita há mais de três meses e participava o falecimento do marido, bem como a sua vinda à nossa terra, pois que voltava para expor as suas pinturas na capital.

Beijei as faces do Chico, tisnadas pelo sol, e saltei, mesmo esquecendo que já me queixo muitas vezes de dores reumáticas… Helena ia voltar! E pelas datas, faltavam apenas dois dias para ter possibilidade de a rever… nem havia tempo de fazer projectos… mas ia voltar a ver Helena!

5 comentários:

Maria do Rosário Sousa Fardilha disse...

Antes de mais, obrigada pelo teu texto (que cumpre as regras do Concurso, respeitando o mote) e de que gostei bastante :)

Depois, se não te importares, peço-te um favor. Porque neste texto as fotografias são tb um complemento que facilita a compreensão, seria possível seres tu a postares no http://efamoso.blogspot.com ? É que te basta copiar o corpo todo em "edit" no teu blog e depois fazeres "paste" no efamoso (para termos tb as fotos). Caso contrário tenho que voltar a editar todas as fotografias, intercalando-as com o teu texto.

Obrigada

... e Beijokas

Leonor C.. disse...

Como eu gostei desta história! E tão bem ilustrada! Parabéns e boa sorte!

Bjs.

Leonor

Anónimo disse...

Acho que todos vão viajar juntos no tempo ao ler essa história... Adorei!!
Grande beijo e uma linda semana!! :)

J25 disse...

gosto sempre dos teus textos e este tem um enredo apaixonante...
esperemos que exista um próximo capítulo do Escritor Famoso

Anónimo disse...

"Bis gleich" é melhor. Não votei em ti (não me batas) mas foi o EF que me trouxe a conhecer o teu cantinho maravilhoso. Boa sorte e continua!