segunda-feira, janeiro 19, 2009

A HISTÓRIA DE MAGDA (continuação)

A Terceira Sessão

Magda chegou cinco minutos antes da hora marcada, mas como a aguardava, entrou de imediato no meu gabinete e depois de se instalar no sofá à minha frente, recomeçou a sua descrição de vida, como senão houvera parado por uns dias…

O Natal surgiu mais ou menos três meses depois de Magda ter iniciado a sua vida escolar.

Nos anos cinquenta, o ano escolar tinha o seu dia inaugural a sete de Outubro.

Magda parou um instante de falar, e sorrindo disse-me “sinceramente, estou a ser muito pormenorizada, não é verdade?” Respondi-lhe que o que interessava era dizer tudo o quanto necessitasse, pois seria essa a forma de podermos encontrar o ponto onde haviam iniciados as suas angústias, tristeza e medos, por forma a colaborarmos no seu desvanecimento.

À medida que Magda ia relatando a sua história, eu observava as múltiplas contracções de sobrancelhas, o encolher do lábio superior, por sinal muito bem desenhado, e ia concluindo que naquela parte da vida de Magda, nem tudo era tão risonho como ela o tentava fazer crer.

Passaram alguns minutos além das duas horas e Magda voltou a parar, levantando-se, pediu para pararmos.

Despedimo-nos e marcámos nova sessão para daí a dois dias no mesmo horário e ainda no meu gabinete de atendimento.

Dois dias depois…

Estava impaciente com o aproximar da hora de chegada de Magda.

Havia algo naquela mulher que me suscitava uma curiosidade imensa e me fazia imaginá-la como alguém misterioso e com angustias muito bem disfarçadas. O “toque-toque” dos nós dos dedos na porta do meu gabinete de atendimento e o seu característico “dá-me licença” fizeram-me acordar de uma sonolência que me deixara melancólica e ansiosa.

Depois de se sentar na poltrona à minha frente, Magda continuou, como se apenas tivesse interrompido para beber um gole de água...

Aos sete anos e seis meses de idade, Magda soube o que era o seu primeiro período de férias. Não teve necessidade de se levantar às oito da manhã para entrar na Escola às nove e podia brincar até à hora do almoço e à tarde, enquanto a mãe descansava das tarefas domésticas, recordava um pouco do que aprendera na escola e voltava a brincar com a irmã, logo que esta acordava da sesta.

Magda, até ter entrado na escola, ouvira da mãe e das tias avós todas as histórias que se contavam às crianças: O Príncipe com Orelhas de Burro; A Bela Adormecida; A Gata Borralheira; o Gato das Botas e tantas outras, onde reis e príncipes, ao lado de belas rainhas e princesas, comandavam reinos, onde a felicidade e a bondade eram uma realidade, embora ensombradas, por vezes, por bruxas más e magias inacreditáveis. Magda punha-se então a pensar que nunca deixaria os maus livres, para que não fizessem maldades aos bons.

Magda fez uma pausa e reparei que os seus olhos estavam vidrados, mas não interrompi o seu silêncio. Uns segundos depois, Magda, ao jeito de suspiro, disse-me que me havia de falar das pessoas boas que conhecera ao longo da vida, que lhe avivasse a memória, caso esta a traísse.

Na realidade, hoje encontrei Magda mais abatida e cansada e observei-lho, ao que me disse que todo o seu estado estava relacionado com a data, pois fazia quarenta e cinco anos que conhecera a pessoa mais maravilhosa que se podia imaginar. Não acrescentou mais nada e pausadamente continuou a sua narrativa.

(continua)

Sem comentários: